Resolução do Parlamento Europeu, de 12 de março de 2025, sobre a necessidade de apoio da UE para uma transição justa e a reconstrução na Síria ()
O Parlamento Europeu,
–Tendo em conta a Resolução 2254 (2015) do Conselho de Segurança das Nações Unidas, de 18 de dezembro de 2015,
–Tendo em conta a criação da Instituição Independente das Nações Unidas para as Pessoas Desaparecidas na República Árabe Síria, ao abrigo da Resolução 77/301 da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 29 de junho de 2023,
–Tendo em conta a sua recomendação ao Conselho, à Comissão e ao Vice‑Presidente da Comissão/Alto Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, de 28 de fevereiro de 2024, referente à situação na Síria(1),
–Tendo em conta a declaração da Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança de 9 de dezembro de 2024,
–Tendo em conta as conclusões do Conselho de 19 de dezembro de 2024,
–Tendo em conta os despachos do Tribunal Judicial de Paris, de 14 de novembro de 2023 e de 21 de janeiro de 2025, que emitem mandados de detenção internacionais contra Bashar al‑Assad e membros da sua família, e os processos de jurisdição universal nos tribunais europeus,
–Tendo em conta a declaração conjunta dos Governos da França, Síria, Barém, Canadá, Egito, Alemanha, Grécia, Iraque, Itália, Japão, Jordânia, Koweit, Líbano, Omã, Catar, Arábia Saudita, Espanha, Turquia, Emirados Árabes Unidos e Reino Unido, da União Europeia, do Enviado Especial das Nações Unidas para a Síria, do secretário‑geral da Liga dos Estados Árabes e do secretário‑geral do Conselho de Cooperação para os Estados Árabes do Golfo, de 13 de fevereiro de 2025,
–Tendo em conta aDecisão (PESC) 2025/406 do Conselho, de 24defevereiro de2025, que altera aDecisão 2013/255/PESC que impõe medidas restritivas tendo em conta a situação na Síria(2),
–Tendo em conta a declaração emitida na sequência da Conferência de Diálogo Nacional da Síria, realizada em Damasco, em 25 de fevereiro de 2025,
–Tendo em conta a declaração, de 8 de março de 2025, do porta‑voz do Serviço Europeu para a Ação Externa sobre os últimos acontecimentos na Síria,
–Tendo em conta o artigo136.º, n.os 2 e 4, do seu Regimento,
A.Considerando que, em dezembro de 2024, a Síria assistiu a mudanças profundas, quando a coligação rebelde constituída pelo grupo armado Hay’at Tahrir al‑Sham (Organização para a Libertação do Levante – HTS), o Exército Nacional Sírio (SNA), a Sala de Operações do Sul (antiga Frente do Sul) e várias outras forças da oposição derrubaram o regime assassino de Bashar al‑Assad; considerando que o colapso histórico da dinastia Assad marcou o final de meio século de sofrimento do povo sírio, nomeadamente da tirania e caos sem precedentes que se verificaram depois de Bashar al‑Assad ter reprimido brutalmente a revolta de 2011 e ter conduzido o país à guerra civil, assim como o início de um novo capítulo para o povo sírio e para o Médio Oriente em geral;
B.Considerando que o regime de Assad participou em ações sistemáticas de repressão, detenções em massa, tortura, desaparecimentos forçados, execuções extrajudiciais e outras violações graves dos direitos humanos e é responsável por crimes de guerra documentados e crimes contra a humanidade, incluindo o ataque deliberado a civis, a táticas de cerco que resultaram em fome em massa, a utilização de bombas de barril e a utilização de armas químicas, em violação do direito internacional; considerando que, desde 2011, pelo menos meio milhão de sírios morreram e 14 milhões foram forçados a fugir das suas casas, dos quais cerca de 7 milhões foram deslocados à força, em resultado da repressão feroz e da engenharia demográfica do regime de Assad e dos seus aliados, bem como às mãos de grupos terroristas; considerando que o destino e paradeiro de dezenas de milhares de pessoas permanecem desconhecidos;
C.Considerando que a Rússia e o Irão foram facilitadores e intervenientes ativos na guerra travada pelo regime sangrento de Assad contra o seu próprio povo e utilizaram a Síria como um campo de batalha geopolítico para desestabilizar a região, como plataforma para o tráfico de armas e de drogas, como campo de testes para capacidades e táticas militares, visando sistematicamente infraestruturas civis e comboios de ajuda humanitária, em clara violação do direito internacional; considerando que o poder de Assad dependia do apoio e do fornecimento contínuos de pessoal e de armamento por parte da Rússia e do Irão, bem como das suas forças interpostas, incluindo o Grupo Wagner, o Hezbollah libanês, milícias iraquianas e mercenários afegãos; considerando que a sua queda súbita é uma clara derrota geoestratégica para ambos os países;
D.Considerando que, depois de ter assumido um papel de liderança no derrube do regime, Ahmed al‑Sharaa, antigo dirigente do HTS, foi designado presidente interino e lançou um processo de transição política que abarcava planos para uma nova Constituição e para a realização de eleições dentro de quatro a cinco anos; considerando que o presidente interino foi incumbido de formar um conselho legislativo temporário, nomeou um governo provisório e comprometeu‑se a criar, até ao início de março de2025, um novo governo não sectário, englobante, credível e inclusivo que refletisse a diversidade étnica e religiosa da Síria; considerando que, em 24 e 25 de fevereiro de2025, o Governo provisório sírio realizou a anunciada Conferência de Diálogo Nacional; considerando que a Constituição síria de 2012 foi anulada, e a Assembleia Popular e o partido Baas dissolvidos; considerando que também muitos grupos armados aceitaram formalmente dissolver‑se e integrar o exército sírio;
E.Considerando que a UE se recusou, com razão, a normalizar os seus laços com o regime de Assad até à sua queda e desempenhou um papel significativo como um dos principais doadores de ajuda humanitária aos civis sírios e como anfitrião de 1,3 milhões de refugiados que fogem dos conflitos; considerando que, desde 2011, a UE e os seus Estados‑Membros mobilizaram mais de 33,3 mil milhões de EUR em ajuda humanitária, ao desenvolvimento, económica e de estabilização, centrando‑se na assistência vital, nos programas de resiliência e no objetivo político de aplicação da Resolução 2254 (2015) do Conselho de Segurança da ONU; considerando que a UE iniciou uma ponte aérea humanitária em dezembro de 2024 para prestar cuidados de saúde de emergência e fornecer outros bens essenciais; considerando que, após o derrube do regime de Assad, alguns Estados‑Membros anunciaram a suspensão dos pedidos de asilo pendentes apresentados por sírios; considerando que a UE suspendeu as sanções impostas a setores económicos fundamentais procurando facilitar as relações com a Síria e a sua reconstrução;
F.Considerando que as autoridades do governo provisório controlam a maior parte, mas não a totalidade, do território sírio, e que a situação geral da segurança na Síria se mantém fragmentada e instável; considerando que os acontecimentos violentos, incluindo os assassínios por vingança, a violência sectária e as atividades criminosas, parecem estar a aumentar, em particular nas zonas costeiras e rurais; considerando que os grupos armados pró‑Assad e, alegadamente, outros grupos levaram a cabo ataques coordenados, que começaram em 6 de março de 2025 nas províncias de Latakia, Tartus e Homs e culminaram em confrontos mortais com as forças de segurança sírias; considerando que, em resposta, membros das forças de segurança sírias e do exército nacional sírio, combatentes estrangeiros e jiadistas terão participado em retaliações e execuções injustificáveis contra civis alauitas com base na sua filiação etno‑religiosa; lamenta igualmente o assassínio de, pelo menos, dez cristãos; considerando que, não obstante a declaração feita pelo presidente de facto, Ahmed al‑Sharaa, os combates duraram vários dias e fizeram mais de 1000 vítimas até à data; considerando que o presidente de facto Ahmed al‑Sharaa anunciou a criação de uma «comissão de inquérito» e de uma «comissão de alto nível»;
G.Considerando que o nordeste da Síria continua a ser governado pela autoproclamada Administração Autónoma Democrática do Norte e Leste da Síria e controlado militarmente pelas Forças Democráticas Sírias (FDS), lideradas pelos curdos; considerando que, em 10 de março de 2025, foi assinado um acordo conjuntamente pelo presidente de facto, Ahmed al‑Sharaa, e pelo comandante‑chefe das SDF, Mazloum Abdi, que previa a sua integração em todas as instituições do Estado sírio; considerando que, desde dezembro de 2024, as milícias do Exército Nacional Sírio (SNA) apoiadas pela Turquia, algumas das quais não foram incluídas no governo de transição, e a própria Turquia intensificaram os ataques e incursões no território do nordeste da Síria, incluindo ataques contra a população e as infraestruturas civis nas zonas de Manbij e Kobani, que podem constituir crimes de guerra;
H.Considerando que Israel ocupa uma parte do território sírio nos montes Golã desde 1967; considerando que, na sequência do derrube do regime de Assad, Israel apoderou‑se da zona desmilitarizada patrulhada pelas Nações Unidas para lá dos Montes Golã e atacou reiteradamente alvos militares na Síria; considerando que o ministro da Defesa israelita declarou que as Forças Armadas israelitas ((IDF, do inglês Israel Defense Forces) permanecerão indefinidamente no cume do monte Hermon e na zona de segurança;
I.Considerando que a Rússia procura manter as suas bases militares na Síria, em particular a base naval de Tartus e o aeródromo militar de Hmeimim; considerando que Bashar al‑Assad e a sua família fugiram do país, tendo‑lhes sido concedido asilo político na Rússia; considerando que foi estabelecido um contacto diplomático entre a Rússia e as novas autoridades sírias;
J.Considerando que o regime de Assad apoiou a invasão da Ucrânia pela Rússia e reconheceu as regiões ocupadas de Luhansk e Donetsk no leste da Ucrânia, assim como a região da Abcásia na Geórgia; considerando que o serviço de informações militares de segurança da Ucrânia fez saber sistematicamente que a Rússia estava a treinar mercenários recrutados na Síria para darem apoio à guerra levada a cabo pela Rússia contra a Ucrânia; considerando que a iniciativa «Cereais da Ucrânia» foi posta em prática na Síria após a suspensão das exportações de alimentos russos;
K.Considerando que o Daexe causou um enorme sofrimento na Síria, provocou numerosos ataques terroristas por todo o mundo e continua a operar dentro e a partir da Síria, assente no seu centro de planeamento operacional externo na região de Badia; considerando que cerca de 10 000 combatentes do Daexe e 40 000 membros familiares do Daexe estão atualmente detidos nos centros de detenção de Al‑Hol e Roj, sob a vigilância sobretudo das Forças Democráticas Sírias (FDS) dirigidas pelos curdos; considerando que as forças de segurança sírias poderão vir a assumir a gestão dos centros de detenção, na sequência do acordo de 10 de março de 2025 entre o presidente de facto, Ahmed al‑Sharaa, e o comandante‑chefe das SDF, Mazloum Abdi;
L.Considerando que a população cristã da Síria diminuiu acentuadamente desde 2011 devido ao facto de ter sido alvo de ataques pelo regime de Assad, bem como pelo Daexe e outros grupos terroristas;
M.Considerando que a situação na Síria continua a constituir uma das crises humanitárias mais graves do mundo, com nove em cada 10 sírios a viver abaixo do limiar da pobreza e quase 17milhões de pessoas — 70% da população síria — a necessitar de ajuda humanitária devido à insegurança alimentar generalizada e à ausência de infraestruturas básicas e de serviços públicos;
N.Considerando que, de acordo com o Gabinete de Coordenação dos Assuntos Humanitários das Nações Unidas, a resposta humanitária a favor da Síria está claramente subfinanciada, tendo obtido menos de 10% dos 1,2 mil milhões de dólares necessários até março de 2025; considerando que o decreto presidencial emitido pela Administração do presidente dos EUA, Donald Trump, que suspende durante 90dias todos os programas de assistência externa, incluindo os administrados pela Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), tem e terá um impacto nos programas humanitários e nas organizações não governamentais que operam no terreno na Síria; considerando que o Reino Unido e vários Estados‑Membros também anunciaram cortes notáveis nos seus orçamentos globais consagrados à ajuda;
O.Considerando que a Síria se encontra numa situação económica extremamente dramática, caracterizada por uma inflação galopante que atingiu um nível sem precedentes de 40,2% em 2024, pela escassez de eletricidade e pelo aumento dos preços das matérias‑primas; considerando que o colapso da economia síria foi exacerbado pela corrupção do regime, por políticas económicas predatórias e pela dependência de atividades ilícitas, incluindo a produção e o tráfico de Captagon; considerando que é necessário um esforço de reconstrução colossal a par de uma transição para uma economia de mercado aberto, num contexto em que as exportações registaram uma diminuição drástica em comparação com os níveis anteriores à guerra;
P.Considerando que 5,5milhões de refugiados sírios vivem nos cinco países vizinhos da Síria, isto é, a Turquia, o Líbano, a Jordânia, o Iraque e o Egito, e que a UE presta assistência financeira para ajudar a suportar os custos associados; considerando que cerca de 500 000 pessoas internamente deslocadas e 300 000 refugiados externos regressaram às suas zonas de origem desde o colapso do regime de Assad e são confrontados com serviços inadequados, meios de subsistência limitados e infraestruturas danificadas que impedem a sua reintegração sustentável;
1.Louva a coragem, a dignidade e a resiliência do povo sírio, que acabou por conseguir derrubar a ditadura cruel de Assad; presta homenagem às inúmeras vítimas do regime; insta a UE a aproveitar esta oportunidade histórica para apoiar uma transição política liderada pela Síria, a fim de unir e reconstruir o país e ajudar a Síria a implementar a sua reconstrução e a alcançar uma transição política justa e inclusiva; continua preocupado, todavia, com o elevado grau de instabilidade na Síria e na região; sublinha que uma Síria estável e pacífica é do interesse do Médio Oriente, da vizinhança meridional da UE e da própria UE;
2.Congratula‑se com o novo início das relações entre a UE e a Síria, que se manifesta pela nomeação de um encarregado de negócios da UE em Damasco, pelo empenhamento diplomático e as reuniões de alto nível realizadas pelos Estados‑Membros e pelos dirigentes da UE, bem como pela aguardada organização da Nona Conferência de Bruxelas, prevista para 17 de março de 2025; exorta a UE e todos os Estados‑Membros a cooperarem com as autoridades provisórias da Síria de forma transparente, coordenada e responsável e a comunicarem a sua disponibilidade para prestar assistência à construção do Estado, se e conforme necessário; congratula‑se com o diálogo realizado em conjunto com os parceiros regionais no chamado formato de «Aqaba»;
3.Está firmemente convicto de que a estabilidade na Síria vai resultar de uma transição política pluralista que inclua representantes credíveis de todas as componentes da sociedade síria e zonas geográficas do país, ou seja, todas as comunidades religiosas e étnicas, as mulheres, a sociedade civil e as forças da oposição pacíficas; congratula‑se com o reconhecimento da diversidade da Síria pelo presidente interino, constatando simultaneamente que a composição do atual governo provisório ainda não cumpre nesta matéria; sublinha a importância de o futuro governo refletir essa pluralidade e de um futuro quadro constitucional que garanta a igualdade de direitos e o acesso a oportunidades para todos os sírios – em conformidade com os princípios da democracia, do Estado de direito e das liberdades e direitos fundamentais, incluindo a liberdade religiosa, como defendidos pelo direito internacional –, bem como provas claras e concretas de que esses direitos são respeitados nas decisões nacionais e locais;
4.Regista, neste contexto, a conferência de diálogo nacional, que teve lugar em 25 de fevereiro de 2025, como ponto de partida para instituir uma cultura de diálogo em prol de todos os sírios; manifesta a sua preocupação com a exclusão dos representantes políticos dos curdos e por não ter sido assegurada a participação de todos os segmentos da sociedade civil síria, em particular das mulheres; recorda ainda que este diálogo deve ser mantido a fim de evitar o aprofundamento das divisões sociais e da discórdia entre setores fundamentais da sociedade síria e uma maior desestabilização de uma situação de segurança que já é frágil; insta o governo provisório a elaborar um roteiro que defina o seu plano para a execução do processo de transição política e a melhorar a transparência em relação aos cidadãos sírios;
5.Observa com preocupação o passado violento das fações que derrubaram o regime de Assad e fazem agora parte do governo; toma boa nota das declarações de intenções do presidente interino, que se comprometendo simultaneamente a acompanhar as ações das autoridades nacionais e locais quando ponderar um maior envolvimento; manifesta um otimismo cauteloso em relação ao comportamento das autoridades provisórias relativamente à liberdade de religião e insta‑as a adotar novas medidas de reforço da confiança; exorta a Alta Representante para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança e os Estados‑Membros a pronunciarem‑se sistematicamente contra eventuais violações das liberdades fundamentais e dos direitos humanos na Síria por parte do governo provisório ou de outros grupos;
6.Manifesta a sua profunda preocupação com a frágil situação de segurança em toda a Síria, em particular na zona costeira, e condena firmemente a retaliação contra a comunidade alauita com base na perceção da sua associação com o regime de Assad; insta as autoridades provisórias a restringirem todas as fações violentas – incluindo as que devem ser incorporadas no exército e nas forças de segurança sírias –, a protegerem todos os cidadãos civis da violência e a garantirem o seu direito a viver em segurança; insta a efetuar investigações rápidas, transparentes e imparciais sobre todos os assassinatos e outras violações e a que os responsáveis sejam responsabilizados, em conformidade com as normas e os padrões jurídicos internacionais; insta o governo provisório a assegurar que todas as nomeações militares e de segurança se baseiem estritamente nas qualificações profissionais, no respeito pelos direitos humanos internacionais e pelo direito humanitário e ainda num compromisso de luta contra o terrorismo; manifesta preocupação com a presença de combatentes extremistas estrangeiros, incluindo cidadãos europeus, entre as forças que derrubaram o regime de Assad e adverte contra a sua integração permanente no aparelho de segurança sírio; reconhece o desafio da construção ordeira do Estado associado ao risco de insurreição por parte de grupos armados leais ao antigo regime; exorta as autoridades provisórias a organizarem um desarmamento paramilitar e civil;
7.Louva o contributo inestimável da sociedade civil, na Síria e no estrangeiro, enquanto repositório legítimo e defensor das aspirações do povo sírio durante anos de opressão brutal; presta especial homenagem aos Capacetes Brancos, que foram alvo de uma campanha de difamação orquestrada pelo regime e apoiada pela Rússia; insta a UE a aumentar o apoio financeiro, em especial, às organizações da sociedade civil da Síria à medida que se adaptam à mudança das condições de operação, com destaque para a promoção do diálogo cívico, nomeadamente entre comunidades étnicas, culturais e religiosas, a fim de promover o pluralismo, a coexistência pacífica e a confiança na sociedade síria;
8.Salienta a importância de reconhecer o papel da violência sexualizada e baseada no género nos processos de justiça e responsabilização, bem como das políticas destinadas a assegurar a participação e representação plenas das mulheres na vida política e a sua emancipação económica; solicita, além disso, que se aborde especificamente o sofrimento infligido às crianças;
9.Manifesta preocupação com o aumento exponencial da desinformação proveniente da Síria e do estrangeiro; alerta para o risco de instrumentalização das comunidades também por parte de intervenientes estrangeiros; salienta a necessidade de um panorama mediático pluralista prosperar e funcionar sem censura e ao abrigo de uma liberdade de imprensa protegida legalmente; insta a UE e os seus Estados‑Membros a disponibilizarem financiamento e reforço das capacidades a este respeito;
10.Está firmemente convicto de que o sucesso da transição política síria, nomeadamente a salvaguarda da paz civil e a criação de confiança nas instituições do Estado, depende da justiça transicional e da reconciliação como via para combater a impunidade de todas as partes responsáveis por violações do direito humanitário internacional e dos direitos humanos; solicita que a reforma judicial se torne uma prioridade política urgente; incentiva o governo provisório da Síria a criar um comité independente de justiça transicional para garantir a responsabilização pelas violações dos direitos humanos cometidas no passado por todas as milícias, salientando que a unificação militar não pode ser alcançada sem um mecanismo judicial credível para criar confiança entre os grupos armados, incluindo representantes das milícias do sul, as SDF e antigos oficiais do regime;
11.Insta as autoridades provisórias a cooperarem plenamente com os organismos internacionais competentes, incluindo os mecanismos da ONU criados especificamente para investigar crimes graves na Síria – como o mecanismo internacional, imparcial e independente para a Síria, a Comissão de Inquérito das Nações Unidas sobre a Síria, a Instituição Independente para as Pessoas Desaparecidas e o Relator Especial das Nações Unidas sobre a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes –, e a facilitarem as suas operações no local; incentiva a Síria a ratificar o Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional (TPI) e a alinhar a legislação nacional em conformidade, bem como a conferir ao TPI uma jurisdição retroativa através de uma declaração; reconhece o contributo insubstituível de Fareed al‑Madhhan («Caesar») para documentar os crimes do regime, bem como o trabalho da Rede Síria de Direitos Humanos na deteção de desaparecimentos; salienta a importância de esses processos serem agora concluídos; exorta a UE a apoiar a renovação do mandato da Comissão Internacional Independente de Inquérito sobre a Síria e a aumentar o financiamento de outros mecanismos, nomeadamente tendo em conta o desinvestimento dos EUA;
12.Louva as medidas adotadas para combater a impunidade através dos processos de jurisdição universal na Alemanha, França e noutros Estados‑Membros contra pessoas ligadas ao regime de Assad e ao Daexe; incentiva os tribunais a prosseguirem esses processos e espera que os novos elementos de prova e uma cooperação frutuosa com as autoridades sírias conduzam a progressos nas investigações e condenações;
13.Salienta a necessidade de as autoridades de transição sírias tomarem urgentemente todas as medidas destinadas a garantir e preservar provas físicas de crimes internacionais graves no país – nomeadamente através da cooperação e do diálogo com peritos internacionais e os mecanismos internacionais atuais – e concederem acesso aos arquivos documentais às organizações competentes; insta a UE a apoiar a recolha atempada de provas no terreno, incluindo o equipamento e conhecimentos especializados forenses para identificar e analisar valas comuns, bem como a recolha de testemunhos de sobreviventes;
14.Salienta que a Síria está entre os países com mais zonas minadas; manifesta‑se alarmado com o número crescente de vítimas, incluindo crianças, que foram mortas ou feridas por minas e outros explosivos – um problema que continua a aumentar à medida que as pessoas começam a regressar à Síria; louva os esforços das organizações internacionais e locais na identificação, marcação e eliminação de engenhos explosivos e insta a UE a apoiar urgentemente os esforços de desminagem em conjunto com agentes especializados e as autoridades sírias;
15.Reitera a mais veemente condenação da utilização deplorável de armas químicas contra civis sírios pelo regime de Assad; congratula‑se com o anúncio feito pelo governo provisório da Síria no sentido de destruir todas as reservas de armas químicas ainda existentes na Síria e com a sua abertura à cooperação com a Organização para a Proibição de Armas Químicas;
16.Congratula‑se com a determinação demonstrada pelas autoridades provisórias em interromper a produção e o tráfico de droga, em particular de «Captagon», que afeta negativamente toda a região há anos; defende a cooperação internacional contra o tráfico de droga, armas e seres humanos;
17.Salienta a importância de proteger o património cultural da Síria e apela à colaboração internacional para restaurar locais históricos e marcos religiosos e impedir o comércio ilícito de artefactos saqueados; insta a UE a apoiar a Síria nos esforços de recuperação de zonas e locais de significado cultural para o público sírio e para o mundo, incluindo Palmira, património mundial da UNESCO, após a sua revoltante destruição parcial pelo Daexe em 2015;
18.Reconhece que a economia síria ficou destruída, com défices consideráveis de investimento para alcançar a estabilidade dos preços e a criação sustentada de emprego; exorta a tomar todas as medidas necessárias para incentivar e facilitar o investimento direto estrangeiro, em conformidade com as normas internacionais, bem como reformas que abordem os direitos à habitação, à terra e à propriedade e ainda políticas de desenvolvimento equilibrado entre as zonas urbanas e rurais, a fim de reduzir as disparidades regionais; incentiva o afastamento económico da Rússia e do Irão, depois de ambos os países terem lucrado com o colapso económico da Síria para extrair recursos e controlar indústrias estratégicas;
19.Congratula‑se com a suspensão gradual e condicional das sanções a uma série de setores económicos e com a prorrogação por tempo indeterminado das isenções humanitárias; sublinha que, apesar dos recentes ajustamentos, as políticas de sanções da UE, dos EUA e do Reino Unido em relação à Síria dificultam os esforços de reconstrução; insta a Comissão e o Conselho a contactarem outros países que impõem sanções à Síria, nomeadamente os EUA e o Reino Unido; apoia o levantamento total, ainda que reversível, de todas as sanções setoriais, com destaque para o setor financeiro, a fim de proporcionar à economia síria uma ajuda vital fundamental, acompanhando de perto o processo de transição política; espera que o cumprimento excessivo continue a ser um problema enquanto as amplas sanções dos EUA e do Reino Unido permanecerem em vigor, nomeadamente tendo em conta a sua dimensão extraterritorial; insta a Comissão e os Estados‑Membros a fornecerem às empresas e aos bancos europeus garantias jurídicas para combater o cumprimento excessivo; solicita, no entanto, a manutenção das sanções específicas contra militares, funcionários, entidades empresariais e pessoas associadas à família Assad; espera que a atualização anual do regime de sanções da UE antes do seu termo, em 1 de junho de 2025, avalie adequadamente a pertinência de todas as sanções renovadas, permitindo a tão necessária clareza; solicita ao Conselho Europeu que defina e comunique claramente as medidas claras que as autoridades sírias devem imperativamente executar e que garanta novas sanções para facilitar ou impedir a ativação de uma reintrodução de sanções;
20.Acolhe favoravelmente o anúncio da Comissão de atribuir 235milhões de EUR em nova ajuda humanitária aos sírios e insta a UE e os seus Estados‑Membros a apoiarem os esforços de ajuda humanitária e de ajuda ao desenvolvimento e a manterem o apoio financeiro aos países vizinhos que acolhem refugiados sírios; convida a UE a explorar vias para utilizar os ativos congelados do regime de Assad para um fundo fiduciário destinado à reconstrução da Síria e à reabilitação e indemnização das vítimas; manifesta a sua profunda preocupação com a suspensão de todo o financiamento da USAID relacionado com a Síria ou os refugiados sírios e com a não participação prevista dos EUA na próxima conferência de Bruxelas;
21.Insta a UE a alargar estrategicamente a sua atenção da ajuda humanitária para a aceleração da recuperação económica e da reconstrução precoces em setores‑chave – como a energia, o abastecimento de água, os cuidados de saúde e a educação – a fim de alcançar resultados concretos, assegurando simultaneamente que a programação seja acompanhada do dever de diligência e de um controlo independente; insta a União Europeia e os seus Estados‑Membros a chegarem a acordo sobre a disponibilização conjunta de financiamento sustentável na Nona Conferência de Bruxelas sobre a Síria, que se aproxima;
22.Congratula‑se com a decisão tomada pela França, por exemplo, de permitir que os refugiados regressem à Síria e participem na sua reconstrução sem arriscarem o seu estatuto, nomeadamente para visitas de reconhecimento à Síria; insta os Estados‑Membros e os países terceiros a reproduzirem urgentemente esta iniciativa; insta a Comissão a incentivar e a fornecer aos Estados‑Membros orientações e boas práticas sobre a aplicação do direito da UE nesta matéria, nomeadamente no que diz respeito à diferença entre «deslocação» e «restabelecimento»; insiste em que todos os pedidos de estatuto de asilo e renovações devem imperativamente ser avaliados de forma individual e exaustiva; salienta a importância de uma participação equilibrada no processo de transição política da diáspora síria como um recurso fundamental para a transição e a reconstrução do país; reconhece a importância das remessas a par da ajuda pública ao desenvolvimento e insta os Estados‑Membros a levantarem quaisquer restrições ao envio de remessas para a Síria; recorda, além disso, que segundo a Convenção das Nações Unidas relativa ao Estatuto dos Refugiados, as condições para o regresso seguro, voluntário e digno dos refugiados só podem ser cumpridas depois de haver mudanças fundamentais e duradouras na Síria;
23.Recorda a presença de mais de 400000 refugiados palestinianos que residem na Síria, alguns deles deslocados várias vezes, e o papel da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA) na assistência às suas necessidades; recorda o cerco do campo de Yarmouk pelas fações de Assad entre 2013 e 2015;
24.Insta a Síria a libertar‑se das suas notórias alianças de longa data com Teerão e Moscovo, as quais têm causado sofrimento ao povo sírio e contribuído para a desestabilização do Médio Oriente e não só; insta, além disso, as autoridades provisórias sírias a porem termo à presença militar russa na Síria; condena a Rússia por acolher Bashar al‑Assad e a sua família e por os proteger da justiça, depois de ter obstruído a justiça ao interferir ativamente em investigações internacionais e ao vetar as resoluções do Conselho de Segurança da ONU destinadas a combater os crimes de guerra do regime e os seus próprios;
25.Exorta os países vizinhos a respeitarem a integridade territorial e a soberania da Síria e a cessarem imediatamente todos os ataques e incursões no território sírio e a ocupação do mesmo, em conformidade total com o direito internacional;
26.Está firmemente convicto de que a unificação de todos os segmentos da Síria – incluindo a integração de todas as fações armadas num exército nacional – exige uma solução negociada política liderada pela Síria; insta a UE e os Estados‑Membros a utilizarem todos os canais diplomáticos para defender a estabilização da Síria – o que é do interesse da maioria dos países da região – e a apoiarem os debates com vista a uma solução pacífica e estável e a assegurarem que o bem‑estar e a preservação das liberdades fundamentais, dos direitos económicos, sociais e culturais, bem como a igualdade de género de todos os sírios, nomeadamente os que vivem no nordeste da Síria, permaneçam no centro das decisões; acolhe favoravelmente, neste contexto, o acordo de 10 de março de 2025 entre o Presidente de facto, Ahmed al‑Sharaa, e o comandante‑chefe das SDF, Mazloum Abdi, e espera a sua aplicação harmoniosa; regista os resultados positivos das recentes negociações entre os grupos armados curdos na Turquia e o Governo turco com vista ao desarmamento;
27.Insiste na necessidade de proteger os diferentes grupos étnicos e religiosos, a fim de criar uma Síria pacífica; insta, por conseguinte, a União Europeia e os Estados‑Membros a apoiarem o processo de aplicação do acordo entre o Governo de transição sírio e as SDF lideradas pelos curdos, a fim de garantir o pleno reconhecimento e a participação política da comunidade curda na Síria;
28.Salienta a importância do combate contra o Daexe liderado pela coligação internacional – com o apoio inestimável dos combatentes curdos – e exorta‑a a cooperar com o Governo provisório sírio para impedir a reorganização do Daexe e de outros grupos jiadistas; manifesta profunda preocupação pelo facto de os ataques liderados ou apoiados pela Turquia no nordeste da Síria não só causarem vítimas civis e aumentarem o número de pessoas deslocadas internamente, mas também ameaçarem a eficiência e a continuidade da luta contra o Daexe; insta as autoridades provisórias a demonstrarem um compromisso claro com a luta contra o terrorismo e a cooperarem com os parceiros internacionais, tanto para combater as células ativas que ainda se encontram na Síria como para investigar crimes passados, nomeadamente contra a comunidade iazidi;
29.Exorta urgentemente a encontrar uma solução duradoura entre todas as partes interessadas, uma vez que esses campos continuam a ser terreno fértil para a radicalização e constituem uma ameaça latente para a segurança síria e europeia; adverte contra o grave risco de segurança internacional que uma saída súbita dos Estados Unidos da região causaria neste contexto de incerteza; reitera o seu apelo aos Estados‑Membros para que repatriem todos os seus nacionais, especialmente crianças, de Al‑Hol e Roj e que levem os adultos a tribunal em julgamentos justos;
30.Insta a República Islâmica do Irão a cessar todas as atividades destinadas a sabotar os esforços políticos e económicos do governo provisório da Síria e a alterar o statu quo pela força; louva as autoridades provisórias por intercetarem remessas de armas iranianas destinadas ao Hezbolá no Líbano e regozija‑se com o colapso total das vastas infraestruturas e redes iranianas na Síria;
31.Congratula‑se com o compromisso assumido pelo presidente de facto, Ahmed al‑Sharaa, de pretender ter relações pacíficas com todos os vizinhos da Síria; insta as autoridades provisórias da Síria a assegurarem que esse compromisso se transforme em medidas concretas e a absterem‑se de tomar quaisquer medidas que ameacem a segurança dos países vizinhos e mais além;
32.Condena os políticos europeus, incluindo os atuais e antigos deputados ao Parlamento Europeu, que difundiram repetidamente narrativas pró‑Assad e participaram ativamente no branqueamento da ditadura sangrenta; manifesta profunda preocupação com o recente convite do Intergrupo «Cristãos no Médio Oriente» do Parlamento a organizações estreitamente relacionadas com apoiantes de Assad sancionados pela UE;
33.Encarrega a sua Presidente de transmitir a presente resolução às instituições competentes da UE, aos governos e parlamentos dos Estados‑Membros e ao governo provisório da Síria, e de assegurar a sua tradução e publicação em árabe.